10/14/13

O super-prestativo e a morte do visionário

Regras são fundamentais para a convivência e a simples existência e reconhecimento delas já mostra um nível superior de maturidade em uma sociedade. No entanto, algumas vezes, essa importância é extrapolada e as pessoas se esquecem dos motivos pelos quais as regras foram criadas e passam a viver como se a regra fosse mais importante do que elas mesmas. Como se as regras não tivessem sido criadas para que as pessoas fossem mais felizes.

Há algum tempo, eu li um livro sobre uma menina a quem foi ensinado que a obediência era uma qualidade muito importante. Ela testou o conceito e foi muito bem tratada por ser obediente. Sua mente, como a mente de todos nós, era bastante literal e adorava repetir e extrapolar processos que funcionavam. Como era de se esperar, a mente da menina tentou maximizar a sensação de prazer que vinha do reconhecimento da sua obediência e foi exatamente aí que nossa aventura começou.

Com o passar do tempo, a menina aprendeu a fazer o que as pessoas queriam e aprendeu a gostar da sensação de servir aos outros. Ela realmente achava que essa era a forma certa de viver.

Mas, o que há de errado com isso? Quais as possíveis implicações não tão positivas dessa abordagem?

O primeiro ponto que me vem à mente é que um engajamento excessivo a causas alheias pode levar a uma vida com menos paixão. Não a paixão por uma outra pessoa mas a paixão pela vida ou pelas coisas que você faz.
É essa paixão que leva a ter a sensação de que tudo está dando certo e que a vida é fácil. Esse é o sentimento que algumas pessoas chamam de Vigor. O Vigor é uma etapa muito importante dos Sete Estágio de Maturidade.

Pode até haver outras formas de ser feliz na vida mas o Vigor é, definitivamente, uma alternativa que recomendo explorar.

Um outro ponto que convida à reflexão é que, quando alguém se entrega completamente à causa de fazer outras pessoas felizes e faz isso durante muito tempo; passa a ficar realmente bom nisso. Essa atitude passa a ser algo que ele faz sem muito esforço; eu diria até que é algo que chega a fazer de forma até inconsciente. Até aqui, só há pontos positivos.

Não entanto, quando se passa a agir inconscientemente, passa-se a ter também esse padrão como referência inconsciente e, uma referência inconsciente pode dar origem a graves problemas de relacionamento. As pessoas podem passar a exigir das outras que as tratem com a mesma atenção, dedicação e carinho que elas imaginam estarem dando. Ainda que os outros não sejam capazes de retribuir (ou até mesmo perceber) tamanho comprometimento.

Eu acho que é justo exigir tratamento semelhante ao que se dá mas, quando um tratamento beira a excelência e essa perfeição é alcançada de forma inconsciente, como essa pessoa vai perceber que os seres humanos à sua volta podem não ser capazes de dar um tratamento do mesmo nível? Pior ainda, será que essa pessoa é tão boa em perdoar falhas de tratamentos quanto é boa em tratar as pessoas à sua volta?

Já imaginou o tamanho das decepções que ela pode estar armando para a própria vida?

Mas esse nem é o ponto mais obscuro da abordagem super-prestativa. Na verdade, ao se dedicar tão intensamente aos outros, uma pessoa pode acabar por se afastar de sua verdade interior tornando ainda mais difícil descobrir e cumprir sua missão de vida. Negar a própria verdade interior é um dos golpes mais cruéis e mortais que se pode dar no visionário que existe dentro de cada um de nós.

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